Desafios e Implicações da Ausência de Licitação nos Municípios

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A Lei Federal n.º 14.133, conhecida como a Nova Lei de Licitações e Contratos, foi publicada em 1º de abril de 2021. Embora tenha completado três anos de vigência, a maioria dos órgãos públicos começou a utiliza-la efetivamente há pouco mais de quatro meses. Com sua implementação, surgem diversos desafios e inseguranças quanto à correta aplicação de seus dispositivos, especialmente nos municípios que possuem estruturas administrativas menores e menos acesso a capacitações. Um dos procedimentos mais comuns para contratação de bens e serviços é a dispensa de licitação, principalmente em casos onde o valor está abaixo do limite estipulada pela Lei. E este artigo visa abordar as principais dúvidas que surgem entre gestores públicos e licitante sobre a formalização da contratação com base nos incisos I e II do artigo 75, incluindo aspectos como: o termo ”preferencialmente” do §3º do referido artigo; a utilização da forma eletrônica com disputa por lances; e a unidade gestora para fins de somatório das despesas dentro do exercício financeiro.

A primeira provocação que fazemos é acerca do termo “preferencialmente” disposto no § 3º do art. 75, que determina que “as contratações de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão preferencialmente precedidas de divulgação de aviso em sítio eletrônico oficial, pelo prazo mínimo de 3 (três) dias úteis, com a especificação do objeto pretendido e com a manifestação de interesse da Administração em obter propostas adicionais de eventuais interessados, devendo ser selecionada a proposta mais vantajosa.” 

Vale lembrar que os inciso I e II tratam da dispensa em razão do baixo valor, sendo R$ 119.812,02 (cento e dezenove mil oitocentos e doze reais e dois centavos) para contratações de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores, e R$ 59.906,02 (cinquenta e nove mil novecentos e seis reais e dois centavos) no caso de outros serviços e compras. 

Acerca do termo “preferencialmente” é comum ouvirmos questionamos se este trata-se de um poder-dever ou se representa uma discricionariedade da administração pública.

É importante, antes de tudo, entendermos que um dispositivo da lei não deve ser interpretado de forma isolada, é preciso realizar uma interpretação que envolva o sentido e o alcance de suas finalidades. 

O ilustre professor Miguel Reale leciona que “toda interpretação jurídica é de natureza teleológica (finalística) fundada na consistência axiológica (valorativa) do Direito”; “toda interpretação jurídica dá-se numa estrutura de significações, e não de forma isolada”; “cada preceito significa algo situado no todo do ordenamento jurídico”. (Lições Preliminares de Direito, 26ª ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p 293).

Dito isto, qual a intenção do legislador ao prever a necessidade, ainda que preferencialmente, de divulgação prévia da dispensa de licitação, em razão do valor? E associada a essa intenção, quais os valores (princípios) trazidos pela Lei de forma sistêmica? 

Analisando um contexto das contratações, via dispensa de licitação, baseadas nos antigos procedimentos da Lei 8.666/93, percebemos que, em muitos órgãos, tais procedimentos eram precários, limitando-se a contratar, muitas vezes, os mesmos fornecedores por anos, criando-se um conluio e causando prejuízo ao valor contratado pela administração. 

Entendemos, portanto, que a intenção do legislador foi evitar que os erros do passado fossem repetidos com a utilização da nova lei, destacando que os valores limites para a dispensa estão muito maiores do que no antigo regime.

Numa análise sistêmica da norma, cabe enfatizar os princípios descritos no art. 5º da Lei, especialmente os da publicidade, transparência, da competitividade e da economicidade. 

Nesse sentido, o TCM-BA em resposta a consulta realizada pelo Município de Castro Alves entendeu que “na concepção teleológica do termo “preferencialmente” trazido pelo §3º, art. 75, da nova Lei de Licitações, possibilita o Gestor, nas contratações diretas por baixo valor, certa discricionariedade em optar ou não em divulgar o aviso em sítio eletrônico oficial, pelo prazo mínimo de 3 (três) dias úteis. Porém, ao optar em não divulgar o aviso antes da contratação, em uma análise sistemática da lei, a Administração deixaria de observar o princípio da transparência, da publicidade, da igualdade de tratamento aos interessados, bem como dos outros princípios aqui já destacados.”   

Vale destacar que, a IN SEGES/ME n.º 67/21 não deu margem a discricionariedade quanto a divulgação do aviso de dispensa de licitação, logo, todos os órgãos vinculados ao seu cumprimento, obrigatoriamente, deverão cumprir com a determinação. 

O segundo questionamento que trazemos a debate refere-se a vinculação de estados e municípios a realizarem dispensa de forma eletrônica, com disputa por lances. 

O texto legal a ser analisado é o mesmo da discussão anterior, o § 3º do art. 75. Observemos que em momento algum o legislador determina que a dispensa seja realizada em meio eletrônico, nem faz menção a disputa por lances. O que está expresso é a divulgação em sítio eletrônico oficial. 

A criação da Dispensa Eletrônica deu-se por meio da IN SEGES/ME n.º 67/21, e vincula a Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, bem como os órgãos e entidades da Administração Pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, quando executarem recursos da União decorrentes de transferências voluntárias.

Sendo assim, Estados e Municípios, excedo quando executarem recursos de transferências voluntárias da União, não estão obrigados a realizar dispensas de forma eletrônica, com disputa por lances, salvo se regulamentação própria assim determinar. 

E como poderiam ser recepcionadas as propostas, após divulgação do aviso de dispensa de licitação, senão em meio eletrônico? Apesar de orientarmos pela adoção da dispensa eletrônica, por entender ser mais eficiente e gerar maior economia para o erário, outra solução que apresentamos é o recebimento de propostas e documentação via endereço eletrônico, no qual pode-se comprovar data e hora de recebimento das mesmas. 

Em última análise, mas não menos importante, assistimos à discussão acerca do entendimento do conceito de “unidade gestora” para fins de somatório dos valores contratados por dispensa de licitação, no exercício financeiro (entre 1 de janeiro e 31 de dezembro). Em outras palavras, as Secretarias Municipais, que possuem CNPJ, são consideradas unidades gestoras, ou seja, possuem limite de dispensa independente dos demais CNPJs do Órgão? Ou o limite de dispensa deve ser aplicado no Município como um todo? 

Ressaltamos que, a regra é a licitação, devendo, sempre, a contratação direta ser utilizada como exceção, evitando-se o fracionamento de despesas. 

Analisando o conceito de unidade gestora, o portal do Tesouro Nacional define que “Unidade Gestora é a nomenclatura usada para definir as unidades cadastradas no SIAFI investidas do poder de gerir recursos orçamentários e financeiros, próprios ou sob descentralização e cujo titular, em consequência, está sujeito à tomada de contas anual em conformidade com o disposto nos artigos 81 e 82 do Decreto-lei n.º 200, de 25 de fevereiro de 1967.”

Logo, somente os órgãos e entidades dotados de autonomia financeira e orçamentária, cujo ordenador de despesa esteja submetido a jurisdição dos órgãos de controle, é que poderão ser reconhecidos como unidades gestoras para os fins dos limites previstos na Lei 14.133/21.

Os Tribunais de Contas têm entendido que, quando a execução orçamentária for centralizada, aplicam-se os referidos limites à Prefeitura como um todo, incluindo órgãos e secretarias. Por outro lado, caso os recursos orçamentários e financeiros sejam efetivamente descentralizados, impondo responsabilidade na execução orçamentária e financeira, os limites se aplicam para cada uma das unidades gestoras.

Mas como saber se a execução orçamentária é centralizada ou descentralizada no Município? A implantação de descentralização orçamentária e financeira deve ser objeto de ato normativo específico, sendo assim, se não houver Lei que institua a descentralização, não é possível que os limites dispostos nos incisos I e II do art. 75 da Lei 14.133/21 sejam atribuídos as secretarias municipais, ainda que estas possuam CNPJ próprio, sob pena de cometimento de fracionamento de despesa. 

Vale lembrar que a Lei se aplica tanto para o Município de São Paulo/SP, maior Município do Brasil em população, com mais de 11 milhões de habitantes, como para o Município de Serra da Saudade/MG, menor Município brasileiro em população, com 833 habilitantes. 

Se considerarmos que o limite de dispensa possa ser aplicado por CNPJ, sabendo que, para recebimento de recursos federais, as Secretarias Municipais de Saúde, Assistência Social e Educação, possuem CNPJs próprios, além da inscrição geral, o Município de Serra da Saudade teria a dispensa de licitação como regra e a licitação como exceção, e acreditamos não ser essa a intenção do legislador.

Em resumo, acerca das frequentes dúvidas sobre o tema dispensa de licitação pelos Municípios temos que: 

  1. O termo preferencialmente, disposto no §3º do art. 75 da Lei 14.133/21, deve ser analisado e cuidadosamente, devendo o gestor valer-se de justificativas sempre que optar em não realizar a divulgação do aviso de licitação, para não incorrer em afronta aos princípios que norteiam as licitações públicas.    
  2. A dispensa eletrônica, com disputa por lances, não é obrigatória para Estados e Municípios, exceto quando estes executarem recursos de transferência voluntárias da União, salvo a existência de regulamentação própria que assim determine; 
  3. A existência de CNPJ próprio, nas secretarias municipais, por si só não possibilita a utilização dos limites dispostos nos incisos I e II do art. 75 da Lei Geral de Licitações de forma individual e isolada, somente se houver descentralização orçamentária e financeira, instituída por norma legal. 

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Artigo desenvolvido por: Raphaela Brasil

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